segunda-feira, 23 de julho de 2012

O Estado de S. Paulo - 'Potências não dão alternativas ao Irã'


Última frase muito interessante: "Quanto mais pressão externa, mais radical será a política doméstica no Irã. Não há dúvidas quanto a isso." As atuais sanções econômicas não são a maneira correta de lidar com o Irã. Só cria mais ressentimento. Claro que para Israel e os EUA não é conveniente ter uma potência árabe anti-Israel florescente. Melhor que fiquem mal!


O Estado de S. Paulo - 'Potências não dão alternativas ao Irã'/ Entrevista Seyed Mousavian

Para 'voz moderada' da diplomacia de Teerã, maior transparência e respeito a direitos iranianos são as chaves para disputa nuclear
ROBERTO SIMON - Nos últimos anos, o embaixador Seyed Hossein Mousavian foi da cúpula da República Islâmica, onde atuava como um dos principais conselheiros, a uma prisão iraniana, acusado de espionagem. Mas sua opinião continuou a mesma: Ocidente e Irã podem achar uma solução negociada para a questão nuclear, desde que Teerã atue de modo transparente e as potências reconheçam o direito iraniano a tecnologia atômica para fins pacíficos.
Hoje trabalhando como professor convidado na Universidade Princeton, Mousavian falou por telefone com o Estado.
Comecemos pela grande pergunta: o Irã está em busca da bomba atômica?
Estou certo de que a resposta é "não". Na Guerra Irã-Iraque (1980-1988), quando Saddam Hussein matou e feriu 60 mil iranianos com armas químicas, o Exército do Irã estava prestes a retaliar da mesma forma. Mas o líder supremo, imã Ruhollah Khomeini, o impediu, dizendo que armas de destruição em massa eram proibidas pela religião. Ou seja: o Irã rejeitou responder com armas não convencionais mesmo diante de um ataque químico em uma guerra. É a prova mais contundente de que a república islâmica realmente está comprometida com sua crença religiosa, que veta armas de destruição de massa.
E como explicar, por exemplo, as conclusões do último relatório da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), de que o Irã buscou - e talvez ainda esteja buscando - tecnologia nuclear para fins militares?
O tom e a linguagem da AIEA claramente mudaram desde que (Yukia) Amano assumiu a organização, em 2009. Seu antecessor, (Mohamed) ElBaradei, publicamente afirmou: "Não temos nenhum indício de que o programa iraniano tem objetivos militares". Essa mudança é explicada por um despacho da Embaixada Americana em Viena vazado pelo WikiLeaks, segundo o qual Amano estava "no campo dos EUA", contra o Irã. É evidente que houve um entendimento entre Amano e Washington.
Mas, durante o mandato de Baradei, o Irã não enriquecia urânio a 20%, um dos principais motivos de preocupação das potências ocidentais.
De fato com Baradei o Irã não enriquecia a 20% e, mesmo sob Amano, Teerã não queria dar essa passo. Em fevereiro de 2010, o chefe da agência atômica iraniana disse em uma entrevista à rede Al-Jazeera que, se as potências não cortassem o suprimento de combustível, os iranianos não enriqueceriam urânio a 20%. Teerã queria manter o grau de enriquecimento a 5%. Infelizmente, o P5+1 (cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU e a Alemanha) rejeitou a oferta. Em setembro daquele ano, o presidente Mahmoud Ahmadinejad, em visita à sede da ONU, disse que suspenderia o processamento a 20% se recebesse o combustível. Novamente o Ocidente recusou a oferta. As potências não deram alternativa.
E qual é a chave para destravar o diálogo?
A chave é fácil de ser identificada. Onde está a "linha vermelha", o limite, para o P5+1? Se for a bomba atômica, a solução é simples. Mas, se for proibir o Irã de enriquecer urânio, não haverá saída, pois isso é um direito iraniano. A solução para a crise é um plano de quatro pilares - dois para o lado iraniano, dois para o Ocidente. O Irã deve promover transparência total e esclarecer todas as dúvidas da AIEA. Ao mesmo tempo, deve mostrar que é confiável, reduzindo o enriquecimento de 20% a 5%. Do outro lado, potências devem reconhecer o direito do Irã de ter um programa nuclear de acordo com as normas internacionais. E, finalmente, é preciso gradualmente levantar as sanções.
Potências ocidentais apostam que, se o Irã estiver sob pressão de sanções, pensará duas vezes antes de seguir avançando com o programa. Como o sr. vê isso?
É uma visão equivocada. Sanções não serão capazes de fazer o Irã se submeter às demandas deles. Não importa quão fortes sejam as sanções ou quão verdadeira seja a ameaça de intervenção militar, o governo iraniano não mudará sua política nuclear dessa forma. O Irã não abrirá mão de seus direitos. Essas ameaças só afastam uma solução negociada.
O sr. foi acusado de espionagem. Como está agora a situação interna no Irã e como será o país sem Ahmadinejad, que deixará o cargo ano que vem?
A política doméstica do Irã sempre foi complicada e, se o Ocidente começar a ter relações normais, recíprocas e justas com a república islâmica, acredito que esse será um incentivo para os iranianos adotarem uma posição mais moderada.
Isso se aplica também ao âmbito interno?
Sim. Quanto mais pressão externa, mais radical será a política doméstica no Irã. Não há dúvidas quanto a isso.

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